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“ONTEM HAVIA COISAS ESTRANHAS NO CÉU”, de Bruno Risas, estreia em plataformas online depois de receber o Prêmio Loridan-Ivens/CNAP destinado ao melhor longa-metragem de estreia no 42º Cinéma du Réel, França. O filme teve sua estreia no 37º Torino Film Festival, Itália e foi exibido na 23ª Mostra de Cinema de Tiradentes, em Minas Gerais, Brasil e também no 31º FIDMarseille – Festival Internacional de Cinema de Marselha, França, além de receber os prêmios de melhor Work in Progress no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro em 2018 e no Festival Internacional de Cartagena em 2019.

O filme, distribuído pela Vitrine Filmes e produzido pela Sancho&Punta, poderá ser visto na Netflix a partir do dia 15 de outubro. Transitando entre documentário e ficção científica, mostra o cotidiano da família do próprio diretor. Após o pai ficar desempregado, a família é forçada a voltar à antiga casa em um bairro operário de São Paulo. A mãe procura uma saída e acaba abduzida por um objeto no céu. A vida, contudo, segue como se nada houvesse acontecido. Enquanto isso, Bruno filma.

“ONTEM HAVIA COISAS ESTRANHAS NO CÉU” é um filme atento às contradições do cotidiano, instigando os traumas escondidos pela calma plana da vida comum. “Acho que temos que manter as feridas abertas, friccionar as assimetrias, para aí, quem sabe, inventar novas maneiras de estarmos no mundo”, diz o diretor Bruno Risas, que faz sua estreia em longas-metragens.

NOTA DO DIRETOR

Ao longo dos nove anos do processo de Ontem Havia Coisas Estranhas no Céu, minha mãe frequentemente me perguntava “se você pode fazer um filme sobre alguém, por que escolheu fazer sobre a gente, sobre ninguém?” Nunca consegui responder. Mas, talvez tenha a ver com um desejo: esmiuçar o processo de formação de nosso imaginário nesse país inventado, de encarar de frente as contradições e as violências que o formam. Para isso, fazer do cinema um ritual do cotidiano, um trabalho que coloca em questão a própria ideia de trabalho e de como nossa sociedade se organiza. E tentar descobrir como minha intimidade ressoa fraturas coletivas.

Quando minha família voltou para a casa no bairro da Bresser e fizemos a primeira imagem em 2010, era o fim do período Lula que transformou o Brasil numa potência econômica. Os anos passaram e vimos a crise nos EUA chegar à Europa, seguida de intensas transformações políticas e sociais. Nos anos seguintes, vimos as jornadas que dividem o Brasil politicamente, Dilma Roussef sofrer o impeachment, Trump ser eleito presidente dos EUA, a ascensão da direita no mundo e a eleição de Jair Bolsonaro em 2018. Enquanto os marcos da grande História ocorriam, seguíamos fazendo o filme, atentos a como a História acontecia em outro ritmo dentro da casa. Um eterno presente de repetições de gestos, de repetições de narrativas.

Enquanto vivíamos, filmávamos; e enquanto filmávamos, inventávamos nossa própria vida. Logo todes estariam atrás e diante da câmera, partilhando ideias durante as filmagens, as refeições e os descansos. A ficção nos permitiu reinterpretar a vida e performar nossa condição ou nosso desejo contido. Permitiu conectar fios invisíveis, aproximar tempos e atravessar dicotomias, reconfigurando nossa própria existência. Equivaler a grande História e a nossa pequena história; equivaler o documental e o ficcional; o real e o inventado; o espontâneo e o encenado; o absurdo da ficção científica e o absurdo da própria vida cotidiana. Se estamos condenados a esse presente, que possamos reinventá-lo, nem que seja por um instante. Como Viviane, minha mãe, diz no filme “tudo é igual, mas nada é igual; é um gesto que muda, um jeito de olhar. De repente, a gente já sabe de coisas demais.”